Maria do Socorro Silva
(Professora da Universidade Federal de Campina Grande, vinculada ao Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido e educadora popular da rede Enfoc)
Não junto minha voz à dos que, falando em paz, pedem aos oprimidos, aos esfarrapados do mundo, a sua resignação. Minha voz tem outra semântica, tem outra música. Falo da resistência, da indignação, da “justa ira” dos traídos e dos enganados. Do seu direito e do seu dever de rebelar-se contra as transgressões éticas de que são vítimas cada vez mais sofridas (Paulo Freire, 1997, p.113).
Aos setenta dias de decretação de estado de calamidade pública pelo Senado Brasileiro (Decreto Legislativo n° 06 de 20 de março de 2020), devido a crise sanitária do coronavirus, faço esta reflexão num cenário de 31 mil mortes por corvid-19, num processo de tensionamento de orientações entre os poderes federais, estaduais e municipais, e uma falta de diretriz do Ministério da Saúde. Pois se de um lado vemos que somos todos afetados, como sujeitos e coletivo, de outro, vê-se que os efeitos são diferentes e desiguais entre os grupos sociais. Inicialmente transportada da Europa para o Brasil por meio de pessoas das classes média e alta, a covid-19 logo se alastrou pelo país, atingindo, sobretudo, os segmentos mais vulneráveis do ponto de vista socioeconômico.
Esta “questão epocal”2, conforme nos coloca Paulo Freire, evidencia a crise do capitalismo no mundo, onde as contradições entre ricos e pobres e entre as nações só fez aumentar, explicitando as desigualdades sociais e econômicas (privatizações, desregulação e redução da proteção ao trabalho e aos mais vulneráveis socialmente), e a opressão expressa na violência racista, machista, homofóbica, e contra os empobrecidos das periferias e do campo, mais também, evidencia o papel da educação no processo de humanização do ser humano, em especial a função social da escola.
Acentua-se uma politica fundamentada na agressão, no ódio, no desmonte das políticas sociais, na espoliação dos fundos públicos e na desregulamentação do trabalho, uma verdadeira cultura da morte, do desprezo a vida, a implementação de uma “pedagogia da crueldade”, que não se solidariza humanamente com nada e diz “e daí” para todos.
Essa perspectiva se expressa na militarização das escolas e da sociedade, em projetos da Escola Sem Partido, num processo de privatização a partir da parceria entre o empresariado – capital privado com o poder público, as propostas “homeshooling” (escola doméstica), congelamento de carreira e salários dos professores/as, contestação do lugar da escola como espaço de construção de relações sociais e humanas.
O debate hoje é mais do que falar mal de Paulo Freire, é falar mal da escola pública, do/a professor/a, tentar controlá-lo/a, tirando a importância da docência como suporte fundamental para o cotidiano da escola, o lugar da escola não é somente o lugar para preparar para provas e exames, mas um lugar que possibilita os processos de formação humana e de cidadania. A escola é um lugar fundamental para o processo democrático de uma sociedade.
Este debate torna-se urgente e necessário, porque se encontra em curso um processo acelerado de desmonte da educação pública, o MEC, na contramão das exigências do momento, não articulam os entes federados numa perspectiva de buscar estratégias para apoiar as crianças, adolescentes e jovens estudantes neste momento de crise, muito pelo contrário, busca acentuar os mecanismos de controle da escola e do trabalho docente dentro da lógica empresarial e privatista da educação, investindo em aplicativos para assegurar as aulas remotas e as competências e habilidades da Base Curricular.
Uma das grandes pautas de agora são os usos das tecnologias na educação. Ora, as tecnologias nem são propriamente o problema a ser considerado, mas sim a forma como elas são apropriadas. No sistema ultraliberal em que vivemos, elas são apropriadas como fonte de aumento de lucro para um grupo pequeno, além disto, neste momento estão buscando desmontar uma questão básica da educação – a interação presencial entre os sujeitos - discente e docente – e o contexto escolar. O que torna o processo educativo numa perspectiva crítica, fundamental como forma dos sujeitos sociais acessarem os conhecimentos e ferramentas necessários para seu processo de humanização e emancipação.
O cumprimento de carga horária escolar não pode ser prioritário nem uniformizado em um contexto de pandemia, em que o que está em jogo é a sobrevivência das pessoas, sobretudo, da população em condições precárias de vida, grupo social no qual se encontra grande parte das crianças brasileiras que frequentam as redes públicas de ensino ou as instituições comunitárias que estabelecem parcerias com o poder público.
Essa lógica acirra uma perseguição ideológica em toda América Latina, e especialmente no Brasil, que se evidenciaram nos últimos anos, as Pedagogias Críticas, que questionam esta narrativa hegemônica de desumanização, dentre estas se destaca, a perseguição a Paulo Freire, como formulador da Pedagogia Libertadora ou do Oprimido, que passa a ser atacado frontalmente por governos, políticos e líderes ultra neoliberais, conservadores e fascistas, que passam a impor uma visão reacionária, fundamentalista e de controle do papel e da função da escola na sociedade.
Os diferentes autores colocam Paulo Freire como alguém que prezava a democracia, a liberdade, todo o seu pensamento educacional foi baseado no diálogo, na horizontalidade, na relação educador/a-educando/a como parceiros na construção dos conhecimentos e na participação no ambiente educacional.
A situação de desumanização dos seres humanos, que se faz presente na história e na atualidade exige um posicionamento na qual a vida seja o ponto de partida e de relação para a educação, a organização, a mobilização e a luta. Nesse momento, acordar e recordar a humanização posta na Pedagogia Freireana, torna-se fundamental, pois estaremos reflexionando sobre princípios importantes na sua proposta, tais como: a vida como ponto de partida e de chegada de qualquer prática social e educacional, a luta pela igualdade como principio da educação para suscitar a potencia que cada ser humano possui para aprender, a amorosidade regida pelo diálogo aberto, se fazendo valer da empatia recíproca para despertar no outro a vontade de ser mais (FREIRE, 1997).
Neste sentido, a Campanha Latino-Americana e Caribenha em Defesa do Legado de Paulo Freire, lançada em 2019, pelo Conselho de Educação Popular da América-Latina e do Caribe (CEAAL), em aliança com diversos movimentos, organizações e entidades sociais, dentre estes a Confederação Nacional de Trabalhadoras e Trabalhadores na Agricultura Familiar – Contag3, a partir de sua Escola Nacional de Formação, nesse momento de crise sanitária, humanitária, econômica e política, torna-se ainda mais necessária na defesa da humanização, da liberdade, da justiça social e dos direitos dos “esfarrapados do mundo”.
Paulo Freire: um educador comprometido com sua gente e seu tempo
Paulo Freire, um pernambucano nascido em Recife, em 19 de setembro de 1921, formado em Direito, foi professor inicialmente de Filosofia, sua experiência no Setor de educação e cultura do SESI, lhe possibilitou contato com a alfabetização de jovens e adultos. Foi assim que um grupo de professores, sob sua liderança, ensinou 300 adultos a ler e escrever em menos de 40 horas, na cidade de Angicos (RN), em 1963. Isso foi gerando seu envolvimento com os movimentos populares de cultura que emergiam na década de 1960, e inclusive, o convite para coordenar o Plano Nacional de Alfabetização, durante o governo de João Goulart.
Seus pensamentos e sua ação junto aos trabalhadores/as das periferias e os/as camponeses/as fizeram com que Paulo Freire fosse visto como subversivo durante a Ditadura Militar e, como consequência, foi exilado e só pode voltar ao país após 16 anos. Durante este período trabalhou em diversos países do mundo, especialmente na África e outros países da América Latina. Sempre na perspectiva da transformação de contextos sociais opressivos e a favor da autonomia e emancipação dos excluídos.
Freire, em suas obras, nos chama a atenção para o caso brasileiro no que concerne à ausência do diálogo relacionado com a nossa história recente, na qual, desde o colonialismo, fomos atravessados por profundas relações de subordinação, dominação e exploração. Freire vivenciou isso na carne ao ser exilado. Considerava essa experiência uma marca na sua trajetória:
Vocês sabem que houve aquele hiato tremendo entre o 1.º de abril de 1964 e o tempo da abertura. Uma das características fundamentais de todo regime de arbítrio é precisamente a tentativa que todos eles têm feito de apagar a história como se eles sentissem a necessidade imensa de começar a história de novo, como se antes deles tudo fosse ruim. Fazem um hiato na história. A juventude do tempo do arbítrio fica proibida de informar-se, desaber o que houve antes do arbítrio. Houve isso no Brasil, obviamente, e uma quantidade enorme de jovens que estão aí hoje com 18, 22 anos alguns não tinham nascido quando houve o hiato, outros eram crianças têm uma curiosidade enorme sobre isso. (FREIRE, 1995, p.16)
Essa experiência marca sua vida e obra, na qual percebemos uma profunda paixão pela liberdade humana e, ao mesmo tempo, uma rigorosa e sempre renovada busca de uma pedagogia emancipatória. Sua filiação às correntes críticas do pensamento pedagógico se estabelece desde sua primeira obra, Educação e atualidade brasileira4. Além disso, como ele mesmo defendia que, “ a melhor maneira de pensar, é pensar a prática”, as aprendizagens realizadas na sua vivencia em diferentes países, com diferentes sujeitos e povos, se expressa em seus mais de 20 livros escritos, que foram traduzidos e circulam em vários países do mundo - sendo o mais conhecido e traduzido em diferentes idiomas – Pedagogia do Oprimido.
Paulo Freire é o brasileiro que mais recebeu títulos honoris causa pelo mundo. Ao todo, foi homenageado em pelo menos 35 universidades brasileiras e estrangeiras. Além disso, mais de 350 escolas ao redor do mundo levam seu nome. Freire nunca deixou de lutar pela transformação da sociedade e de questionar o poder dominante. Nunca abriu mão do sonho da mudança radical, da luta pela construção de uma sociedade igualitária, tanto do ponto de vista econômico e democrático como do ponto de vista político, racial, sexual e educacional. Esse reconhecimento identificamos na fala de renomados pesquisadores internacionais, conforme depoimento abaixo:
Freire não só representa um revolucionário em educação comprometido com a libertação dos oprimidos, com a luta pela justiça social e a transformação da educação, mas sua pedagogia adquiriu um status legendário. Sua pedagogia começou como um meio de conferir poder a oprimidos camponeses brasileiros atingiu um status legendário através dos anos. Poucos educadores caminham tão sabiamente e com tanta determinação entre as fronteiras da linguagem e da cultura. (MCLAREN, 1987, p.3275)
A luta pela Anistia Internacional dos presos políticos, foi uma luta importante para o processo de abertura política na América Latina, o que possibilitou seu retorno ao Brasil, em 1980, o que possibilitou a continuidade do seu trabalho em nosso país como um educador da esperança. Tendo vivido de 1921 até 1997, pode ao longo de sua vida, também rever sua forma de pensar e aproxima-la cada vez mais de sua prática engajada e compromissada com as possibilidades de se fazer mudanças, de ser autor de uma História como um “tempo de possiblidades”, sempre enfatizando o gosto de ser gente. Por isso, que nos coloca um ensinamento muito importante que as pessoas “se educam em comunhão, mediatizadas pelo mundo” (FREIRE, 1999, p. 69).
Algumas reflexões para nossa prática educativa
A Educação enquanto uma prática social que cria e transmite determinados tipos de saberes, de crenças, de valores, que circula numa sociedade tanto pode atuar para o processo de humanização do ser humano para transformar o mundo em que vive atuar de forma critica e criativa dentro desta sociedade como para desumanização ao manter as pessoas servis à estrutura capitalista, ao mercado, à perpetuação das desigualdades e preconceitos dentro de sua realidade.
O processo de inacabamento e inconclusão do ser humano faz com que as experiências ao longo vida os tornem humanos ou desumanos. Essa visão de Paulo Freire (1978) sobre a aprendizagem da humanidade como um fazer permanente é fundamental. A educação pode ajudar a transformar o homem e a mulher em sujeitos da História. Não qualquer tipo de educação, mas uma educação crítica e dirigida à tomada de decisões e à intervenção social e política, assim manifesta uma concepção de Educação na qual:
Os homens6 são vistos como seres históricos e, portanto, inacabados: na verdade, diferentemente dos outros animais, que são apenas inacabados, mas não são históricos, os homens se sabem inacabados. Têm a consciência de sua inconclusão. Aí se encontram as raízes da educação mesma, como manifestação exclusivamente humana. Isto é, na inconclusão dos homens e na consciência que dela têm. Daí que seja a educação um que fazer permanente. (p.73)
Consciente dos limites macroestruturais, Freire faz a proposta de uma Pedagogia do Oprimido assente na conscientização e na dialogicidade permanente na ação. Essa conscientização faz-se através da inserção crítica dos seres humanos na realidade através da práxis, tendente à construção de uma ação deliberada e transformadora. Essa Educação ele chamou de Educação Libertadora, ou Pedagogia do Oprimido.
Na Pedagogia do Oprimido temos uma educação das classes populares, onde a relação entre opressor e oprimido, precisa ser refletida criticamente. Situando-nos no campo educativo e da prática educativa, na linha de Freire, se se entende que a educação, só por si, não pode mudar o mundo, também é sabido que esta tem um papel crucial na ação problematizadora, transformadora e libertadora, portanto, a “educação forma os sujeitos que mudam o mundo”. Não podemos, por isso, pensar na educação isolada das relações sociais que lhe estão subjacentes. Os processos educacionais não têm vida própria, uma vez que têm conexões com os processos sociais.
Essa perspectiva classista e transformadora foi se evidenciando gradativamente na obra de Paulo Freire, principalmente, a partir da experiência dele no Chile, no Ministério da Educação, onde trabalhou diretamente com o campesinato chileno, teve contato com o campo e se aproximou do referencial marxista, o que trouxe uma mudança na sua leitura de mundo, dos instrumentos para pensar o desenvolvimento da sociedade, pois as formas de dominação negam à maioria a capacidade de pensar, criticar, dialogar e debater sobre o mundo em que vivem.
Essa concepção é fundamental para as práticas educativas junto às classes trabalhadoras do campo e da cidade, porque ela possibilita um entendimento de que o ser humano constantemente aprende e em diferentes espaços, assim, a formação política, profissional, sindical, escolar necessita dialogar com a vida, com o trabalho, com a cultura e com as lutas dos sujeitos a quem ela se destina. Assim, a Educação Popular passa a ser compreendida a partir da contribuição de Freire como uma teoria e uma prática que permeia diferentes espaços e instituições: sindicato, partido, cooperativa, organizações de mulheres, jovens, etc...
Consequentemente, contribui para que possamos pensar tanta a Educação Popular na formação e na luta dos movimentos sociais como na escola pública destinada a classe trabalhadora. Portanto, os movimentos sociais começam a ser entendidos também como práticas sociopolíticas e culturais da sociedade civil que visam à realização de seus projetos por uma vida melhor (SCHERRER-WARREN, 1998), por conseguinte, sujeitos coletivos que se articulam a partir de identidades pessoais e coletivas, na luta pelo reconhecimento de seus direitos e pela afirmação de sua cidadania.
E no Brasil a partir da década de 1990, tendo uma influencia substancial da Pedagogia Freireana emerge o Movimento da Educação do Campo, no qual os movimentos sociais campesinos passam a propor uma Escola que represente os interesses da classe trabalhadora do campo. É no contexto da luta pela terra, pelas águas e pela floresta que a luta por escolas se constitui como motor de mobilização no campo. Ao surgir à demanda por escolarização, o debate pela escola vai se incorporando à luta dos movimentos sociais e sindicais do campo, bem como em organizações e universidades que trabalhavam com Educação Popular junto aos sujeitos campesinos, indígenas e quilombolas.
Consequentemente, uma Educação que se posiciona que se coloca ao lado dos oprimidos, isto gera dialogo e conflito, numa sociedade com tantas desigualdades e exploração suscita conflitos. Para Freire tanto o diálogo como o conflito são fatores constitutivos de um processo de construção democrática, e de uma utopia. O próprio Freire nos coloca porque práticas críticas despertam dialogo e conflito, porque para além da pseudo-neutralidade da pedagogia tradicional e da astúcia da pedagogia liberal, buscávamos mostrar como o diálogo e o conflito se articulam como estratégia do oprimido. Sustentamos que o diálogo se dá entre iguais e diferentes, nunca entre antagônicos. Entre esses, no máximo pode haver um pacto. Entre esses há é o conflito, de natureza contrária ao conflito existente entre iguais e diferentes. (FREIRE, 1995, p.6).
Assumindo, tal como Freire a impossibilidade da neutralidade, e retomando as suas palavras em Pedagogia da Autonomia, “ensinar exige comprometimento”. Freire já nos havia advertido para esta “esperteza com que a ideologia dominante insinua a neutralidade da educação” (FREIRE, 1999, p. 109-110), anunciando ele, contrariamente, que na prática pedagógica “não posso ser uma omissão, mas um sujeito de opções. Devo revelar aos alunos a minha capacidade de analisar, de comparar, de avaliar, de decidir, de optar, de romper”.
Ainda que algumas práticas de sujeitos coletivos venham interrogando essa forma escolar e construindo desde as contradições do presente outras possibilidades, estamos muito longe de romper com a lógica e as bases constituintes da escola capitalista, que atualmente encontra-se reforçada quando as secretarias de educação incorporam as propostas da Base Nacional Comum Curricular, das Avaliações em larga escala ou mesmo da implantação do ensino remoto como estratégias neste momento da crise sanitária.
Dai porque a reação conservadora contra Paulo Freire, na verdade, essa Pedagogia Opressora, expressa na “Escola sem Partido”, na escola que forma indivíduos competentes para o mercado, com o lema de que pretende “acabar com a doutrinação ideológica”, considera os professores/as como aliciadores/as, que a escola só deve ensinar os conteúdos das disciplinas, não deve participar de manifestações, não deve trazer temáticas da realidade para discutir em sala de aula, etc.. Nessa tentativa antidialogica de limitar a liberdade explicita a liberdade, explicita o contexto repressivo e autoritário que está em curso.
Precisamos acreditar na educação crítica, o que implica levar em conta a prática da cidadania e da democracia. Ambas contribuem para a emancipação e para uma educação viável para as classes populares. Uma educação que promove vivências de solidariedade, fraternidade e democracia na qual professores/as são intelectuais e, portanto, fazem uma leitura crítica do mundo.
Por isto, que para vários educadores/as, pesquisadores/as de todo o mundo as contribuições de Paulo Freire continuam atuais para os desafios da educação contemporânea. Conforme expressa Mc Laren (1987, ) o humanismo radical de Freire continua a “oferecer alguns dos mais importantes desafios às mais brutais políticas e práticas que infectam o mundo hoje – guerra, imperialismo, globalização capitalista, repressão política, tortura, racismo, patriarcado, homofobia e triunfalismo religioso”.
Freire (1984) diz que o diálogo entre os seres humanos e o encontro desses para ser mais, precisa ir além das palavras. Esse diálogo necessita pronunciar a palavra verdadeira, a qual tem por objetivo transformar o mundo. Quando Freire fala em lutar para construir uma utopia, ele fala de uma utopia concreta ao invés de uma utopia abstrata, uma utopia enraizada no presente, sempre operando “da tensão entre a denúncia de um presente que está se tornando mais e mais intolerável e o anúncio de um futuro a ser criado, construído – politicamente, esteticamente e eticamente – por nós, homens e mulheres” (FREIRE, 1994, p.91).
Para tanto, o autor defende a ideia de que: se, dizer a palavra verdadeira é transformar o mundo, esse direito não deve ser o de algumas pessoas e sim de todas. “Sem sonhos não há vida, sem sonhos não há seres humanos, sem sonhos não há existência humana” (FREIRE, 2009, p.41). Para que os sonhos se tornem possíveis, numa perspectiva utópica de um tempo que ainda não veio, é preciso trabalhar e educar a esperança, não uma esperança vã, pura resignação, mas uma esperança ativa que constrói alicerces para alcançar os sonhos.
Talvez nestes tempos sombrios de crise sanitária, política e econômica trazer a leitura e a prática de Paulo Freire nos ajude a perceber a brutalidade do capitalismo, e nos ajude a relembrar, a repensar alguns princípios que são fundamentais para oportunizar novas formas de vivências humanas, porque sempre é tempo da gente reiniciar novos caminhos, a amorosidade freireana sempre nos instiga a pensar que é possível mudar as relações entre os seres e o mundo.
2 Para Paulo Freire dentro dos contextos históricos temos problemáticas, temáticas que sintetizam as preocupações mais amplas daquele determinado momento, e concentram as ações do Estado e da Sociedade em torno dos mesmos, no momento atual, vivemos uma questão epocal, que interfere em todas as dimensões coletivas e individuais da sociedade, que é a pandemia do coronavirus.
3 Em Pernambuco esta Campanha tem a coordenação da Federação das trabalhadoras e dos trabalhadores na Agricultura Familiar – Fetape e várias entidades parceiras que atuam com Educação Popular no Estado.
4 Educação e atualidade brasileira originalmente é a tese de Paulo Freire escrita em 1959. Foi concebida com a finalidade de atender às exigências do concurso para efetivação como professor da cadeira de História e Filosofia da Educação na Escola de Belas Artes da Universidade do Recife.
5 McLaren é estudioso de pedagogia crítica e leciona na Universidade da Califórnia, em Los Angeles, é um pesquisador canadense, naturalizado americano.
6 Quando Paulo Freire escreveu Pedagogia do Oprimido se utilizava o gênero masculino para se referir aos seres humanos, posteriormente, ele mesmo faz uma crítica a essa forma de escrever, como influencia de uma visão patriarcal da linguagem e passa a adotar as duas formas de escrita.
REFERENCIAS
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 13. ed. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1984. . Pedagogia da esperança: um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. S. Paulo: Paz e Terra, 1992.
. À sombra desta mangueira, São Paulo, Olho D’água, 1995.
. Pedagogia da Autonomia. São Paulo, 1997.
. Pedagogia da Tolerância. São Paulo: UNESP. 2004.
. Pedagogia da Solidariedade. São Paulo: Villa das Letras Editora, 2009a.
. Professora sim, tia não. São Paulo: Editora Olho d’Água, 2009b.
Pedagogia: diálogo e conflito / Moacir Gadotti, Paulo Freire e Sérgio Guimarães. 4. ed. – São Paulo: Cortez, 1995.
MACLAREN, Peter. A vida nas escolas: uma introdução à pedagogia crítica nos fundamentos da educação. Porto Alegre: Artes Médicas. 1987.
NETO, José Batista; SANTIAGO, Eliete. Contribuições de Paulo Freire para o Pensamento Educacional Latino Americano. Interritórios | Revista de Educação Universidade Federal de Pernambuco. Caruaru, BRASIL. | V.2 | N.2 [2016]
SHERER-WARREN, Ilse. Movimentos Sociais: um ensaio de interpretação sociológica. Florianópolis: UFSC, 1998.
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John Doe
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